quinta-feira, 20 de setembro de 2012

GOLPES CAPITAIS NO MMA: DO APAGÃO DO SOCO NO QUEIXO AO DESESPERO DO GOLPE NO FÍGADO. (PARTE I)

 
Aqui vamos nós mais uma vez para uma aventura pelo fascinante organismo humano, para entender melhor como este responde a certos golpes ou agressões lancinantes em determinadas partes consideradas vitais.
 
Nosso sistema fisiológico é tão fascinante, complexo e simples ao mesmo tempo que chega a ter um botão de liga/desliga para casos extremos. No desmaio, por exemplo, a intenção do “desligar” pode ser de colocar o corpo na horizontal, facilitando o retorno do sangue para o cérebro através da normalização da pressão sanguínea. E o que aconteceria com um atleta ao sofrer um golpe no queixo ou na cabeça? Já vimos isso acontecer várias vezes, e digo sem pestanejar que chega a ser bonito quando encaixado perfeitamente. O soco nocauteador de Dan Henderson sobre Michael Bisping no UFC 100, que lhe rendeu a vitória, foi um desses de arrepiar. Não poderia esquecer do soco “sem noção” que Big Show, astro da WWE, aplicou num árbitro durante um show no ano passado, nocauteando o sujeito, e dessa vez não foi nada combinado. O entendimento do que se passa com o organismo no exato momento do golpe se torna no mínimo intrigante, e aqui apresento algumas explicações, se me permitam.
Henderson nocauteia Bisping no UFC 100
No caso de um soco ou chute acertando a cabeça ou a ponta do queixo de um atleta com determinada força, o estímulo que o cérebro recebe com a pancada é muito intenso e maçante para ser processado de forma instantânea. A mecânica da entrada de um golpe na ponta do queixo faz a cabeça girar mais rapidamente, aumentando o "chicotear" do cérebro dentro da calota craniana. Assim, reações químicas e elétricas são ativadas rapidamente de forma desordenada, provocando praticamente uma pane no sistema, como se o "computador humano" não pudesse processar toda a informação e travasse, levando a um apagão na tentativa de reiniciá-lo de forma harmônica. Assim, quando dizemos que um lutador tem um “queixo duro” significa dizer duas coisas: que o cérebro do cidadão consegue processar o estímulo de forma mais rápida do que o normal ao ser acertado; ou que a musculatura do pescoço do atleta consegue amortecer o movimento brusco após o impacto, o que pode ser conseguido com treinamento específico, inclusive. Anderson Silva, Mauricio Rua, Dan Henderson, Roy Nelson, Rampage Jackson, dentre outros, estão neste seleto grupo de duros na queda.

O que é muito discutido entre todos, mas sem haver estudos comprovando o fato (mito!?), é o possível aumento na lentidão da resposta em caso de golpes repetidos na cabeça ao longo da vida do lutador, o que poderia tornar o atleta mais sensível a golpes. Em outras palavras, seria como se o nosso computador ficasse ultrapassado e precisasse ser reiniciado, com um apagão, toda vez que determinado processamento não fosse possível, deixando o lutador com o chamado “queixo de vidro”.  

Amnésias também são muito recorrentes com este tipo de nocaute e a maior preocupação é com a concussão cerebral, que seria um dano potencialmente fatal com edema e inflamação dessa estrutura vital. Recentemente, Eduardo Dantas foi nocauteado por Tyson Nam no Shooto 33, e por proteção e cautela médica teve que ficar pelo menos 2 meses sem competir, segundo informou o site da Tatame. Aí vem a importância da criação de comissões atléticas que protejam como um todo a integridade do atleta.
Outro golpe capital e que pode decidir uma luta é quando o lutador acerta o fígado do oponente. Muito tradicional no boxe, desferidos através dos ganchos na linha de cintura, ainda não é muito explorado no MMA, mas podemos dizer que Junior “Cigano” do Santos, com seu boxe afiadíssimo, vem tentando minar seus adversários com golpes como esse, e candidatos a nocaute não faltam. Talvez o golpe no fígado mais marcante do MMA recente tenha sido o chute certeiro de Overeem sobre Brock Lesnar no UFC 141, o que praticamente decidiu a luta para o holandês, mestre da trocação.
Chute certeiro no fígado de Overeem sobre Lesnar
Para quem não sabe, o fígado é responsável por várias funções como digestão, armazenamento de energia, preparação na eliminação de substancias tóxicas dentre outras. Essas funções nada tem relação com o resultado de um golpe certeiro no orgão, e de acordo com relatos de lutadores, a dor é incapacitante e a respiração é desesperadoramente prejudicada. Mas, por que?  

Poderíamos caminhar pelas seguintes explicações: a dor pode ser intensa devido ao fato de o fígado ser um orgão com inervação extensa e também pelo seu tamanho e localização mais superficial em relação às outras vísceras, situado no quadrante abdominal direito superior, ou seja, é mais exposto; e devido a proximidade com o nervo frênico, responsável por estimular o diafragma que é o principal músculo respiratório, este seria inibido após a pancada, dificultando a respiração. Diferentemente do golpe na cabeça, o atleta preserva a consciência mas o corpo não responde aos comandos cerebrais, como se os músculos fossem desarmados, ou seja, a chave do desliga mais uma vez é acionada, só que dessa vez o circuito é interrompido no comando do cérebro com a periferia. Não consegui achar estatísticas de morte devido a golpes hepáticos, mas dependendo da força de impacto, a lesão pode ser mortal, e nem sempre um transplante resolverá a história.

De qualquer maneira, tanto um golpe quanto outro, podem decidir uma luta. A noção do quanto nosso organismo é afetado por certas agressões vão sendo melhor elucidadas ao longo do tempo e não à toa, o árbitro tem o poder de interromper a luta nos dois casos, para impedir um estrago ainda maior nos superguerreiros para também preservá-los, claro, para espetáculos futuros.

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Luiz Prota, PhD

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